O grande pátio onde de manhã tomamos sol nem
sempre tem sol, o que demonstra a incúria do governo e a irresponsabilidade
daqueles a quem pagamos para que nos dêem sol, já que não nos podem dar a
liberdade.
Campos de Carvalho - A Lua vem da Àsia
Chovem pétalas sobre a face do morto, a natureza denuncia seus desígnios – reveste os restos, acaçapa as sobras. Do céu nenhum anjo, mas o abutre faz festejo e conduz a prole para o desjejum. Miro as nuvens, penetro a terra com as unhas em sangue e nada favorece a minha ressurreição. Eu sou? Eu estou? Desconhecia esse tipo de morte, nenhuma obra articulou a miscelânea secreta dos reinos, nem esse arquitetar hibrido, tão pouco a fusão – é como recuar ao ovo sem ser germe, é como ser milenar no jardim de infância. Eu existo em tudo e no nível anterior eu era um organismo preso por sistemas – intuo as línguas do mundo e sorvo as raízes da maior árvore do universo, cruzo fendas atemporais e revejo meus antepassados: banhas em mares. Agora sou o algoz de minha carne – aquele que se engole, o antropofágico, o escorpião circulado por chamas, o kamikase. Confesso: eu trazia um sabor de medo, carregava petiscos de trauma no estômago, eu era indigesto. Meus pés possuíam odor de preguiça e meus miolos ansiavam serem beijados assim como um clitóris em plena excitação. Eu era fácil, um alvo fácil para a domesticação. Mas esse-agora-existir não acata paredes, não teme os arames farpados, não se rende aos muros partidários e nem as economics fronteiras. Esse existir transporta mais do que 220 volts para o ninho e só mata o que alimenta. Confiem, só as gralhas são bem-aventuradas!
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